Sufocante...

Posted by Uma Coral chamada Petra on domingo, 15 de fevereiro de 2009


Raiva…libertar esta raiva que me provém da pele. Ira.
Sentimento que nos espicaça a alma sobre quem nos descompõe.
E tu ainda me descompões. Alteras-me. Desarrumas todas a minhas ideias. Desajustas todos os meus ajustes. Desordenas todos os compassos deste coração ainda tão cheio de ti. Desregras o sangue que me corre nas veias. Fico tão bloqueada, que nem sei se ele corre ou se estanca instantaneamente.
Esta cidade é demasiado pequena para nós. Demasiado sufocante.
14 De Fevereiro. Dia dos namorados…estúpido dia…digamos que será um dia de consumismo. Em certos casos até de hipocrisia. O que está mal e não funciona passa a ser prefeito em prol de um jantar num dos restaurantes da moda…porque hoje é dia de quem está enamorado. Há que inventar o dia dos solteiros, o dia dos amantes, ou o dia de quem simplesmente gosta de foder com o coração fechado a sete chaves. Aí existiam mais pessoas a comemorar entusiasticamente.
Se tinha pensado em ti hoje? Claro que pensei. E se não dou muita importância ao dia, hoje senti-o de uma forma diferente. Afinal hoje era o “vosso” primeiro dia dos namorados. O vosso. Tu e outra pessoa. Nada de novo. Mas a merda deste dia vem, como que a espalhar axas para a labareda do excremento que se tornou o meu coração.
Posso espancar-me a mim própria, posso insultar-me usando os nomes mais feios, porque sei que isto é límpido masoquismo emocional. Também nunca disse que era boa em matéria de emoções. Talvez possas apontar-me mais um defeito. Emocionalmente descontrolada.
Lembrei-me de ti. Afigurei o presente que lhe darias. Tive saudades tuas.
Tive a certeza que ela nunca te ofereceria algo tão original e invulgar como as coisas que te ofereci. Jamais. A menos que tente copiar -me. A menos que te finjas surpreendido.
Depois esqueci-me de ti. Fui jantar com as minhas amigas, onde as conversas jamais abordariam o teu nome ou me levariam a ti.
No fim de jantar brindaram-nos com uns bombons (que coisa, tão mais dia de s.valentim), daqueles que trazem na embalagem uma frase foleira, mas que somos sempre tentadas a ler.
Identificava-se connosco.
Li. Guardei silenciosamente.
Para que falar de ti? Para que lembrar-te?
Nem sequer me lembrei que vivemos na mesma cidade, que os ambientes nocturnos não variam muito, e que hoje quase de certeza, vocês, os casalinhos ou pseudo-casais iriam para o vosso jantar com direito a saída noctívaga.
Esqueci-me de ti. Da mesma forma que tu não te lembraste de mim.
Tantas pessoas interessantes à minha volta.
Não sei de ti. Para te ser sincera nem me lembro que fazes parte do meu mundo. Talvez porque na realidade já não faças. Ou pelo menos seria assim que eu pensava.
Copos com semblante a classe. Olhares que até me furam a pele…sons que me fazem divagar.
Avisto alguém de quem gosto. As excepções que me cativaram a alma daquele teu grupinho de amigos.
Sorrio.
Abraços. Sorrisos que estou certa de serem sinceros. Olhares que querem dizer algo e não conseguem.
Tu também estavas. E não tardavas a ficar ao alcance da minha visão.
Taquicardia. Daquela que mais parecem ataques de ansiedade. Suores frios. Mãos trémulas.
Uma breve fuga á casa de banho.
Conversas comigo própria. Respirar profundamente. Lágrimas estúpidas e apressadas.
A minha postura tem que manter-se inalterável.
Viste-me ao longe. Mais precisamente á distância de um bar de dois metros.
Não deixei sequer que os nossos olhares se cruzassem.
Incomodou-te tanto. Preferias nitidamente que eu não estivesse ali. E eu preferia que corresses a dar-me um abraço a felicitar-me por mais um sonho que estou prestes a realizar.
Mas eu estava ali. tu mantiveste-te quieto. Numa serenidade inquietante. E eu numa efervescência interior que mil palavras não descreverão.
Ao teu lado estava ela. Parola como sempre. Saloia. Campónia. Não faz nada o teu género. Não faz, nem que tentes convencer-me.
Vestidos de malha, ou lã justas ao corpo, que ela deve achar perfeito, mas que…fica muito aquém de quem usa esse tipo de traje.
O cu. Ou as nádegas avantajadas e flácidas, que quando se movimentam fazem lembrar aquela personagem de banda desenhada bem conhecida.
O nariz que, diga-se de passagem é bem desproporcional á sua estranha cara. E vamos ficar por aqui. Afinal se ainda me reconheces não faltariam defeitos para descrever a tua namorada.
Também sei qual seria o teu argumento. Tu gostas das pessoas pelo que elas são. Nunca pela embalagem que ostentam.
A tua cor de pele sofreu uma pequena alteração quando me sentiste próxima. Ficaste de uma palidez transparente.
Conheço-te. Reconheço-te.
Aquela tua forma de não saber como estar, de não querer magoar, de tentar olhar sem denunciar.
Preferias que eu não estivesse ali. Quantas vezes o pensaste?
Algumas. Muitas.
Os teus olhos nos meus. Coisa de segundos. Breves segundos.
Nunca aconteceu. Não tão breve.
Estavas ali a menos de um metro de distância. Sorri. Mas fui incapaz de cumprir o ritual dos dois beijinhos e do “olá, como estás”!
Esses mimos seriam o passo que me levariam a vomitar palavras carregadas de raiva.
Carrego mais um dilema. De saber se seria mais inteligente cumprimentar-te, ou dizer-te um olá com paladar a sorriso. Escolhi o último, e tu nem sequer o questionaste.
Tal e qual como dois estranhos. Acho que chegamos ao ponto que agrada a quase todos.
Passado longínquo.

12 comentários:

S. disse...

grande texto, adorei .
identifico-me tanto , que parece que leste a minha mente e escreveste que vias.
simplesmente fantastico.

detesto o dia de s.valentim, odeio . e concordo com a tua ideia de haver um dia dos solteiros.
afinal, o dia dos namorados é uma grande falsidade, namorados e casais, juntos e felizes, a fingir que a vida é um mar de rosas quando nao é assim .
continua.

beijinhos .

Uma Coral chamada Petra disse...

Obrigada...se te identificas sabes exactamente o que senti neste episodio e quando escrevi o texto.

Obrigada pelo comentario. Gostei muito ;) beijinhos

Anónimo disse...

Quando as sensações se atam e não os conseguimos desempecilhar para que se façam entender, por vezes, a preferível conclusão é a escrita.
Gostei muito do texto. Parabéns

Uma Coral chamada Petra disse...

Definiçao perfeita do que leste e do que eu sinto ;) beijinhos

inv3rs0 disse...

ler-te é tão...intróspectivo?!

Anónimo disse...

Coral:

Não querendo fazer do teu blog a publicação do meu, encontra as respostas onde eu as encontrei (numa amiga com quase 50 anos, nada dada a estas modernices!!):

http://docesaboraveneno.blogspot.com/2008/05/respostas.html

um abraço... daqueles que tu precisas hoje e que a mim já me fizeram tanta... tanta falta.

Beijo na tua testa!

Anónimo disse...

olha... olhando bem para tudo isto que escresves... sinto-me como omaluco no meio da ponte.

Estou aqui se vieres por bem. E a mal... esotu aqui também!

Beijo... daqueles que eu preciso|

Inês e Mafalda disse...

Quando li este texto fiquei estupefacta . Poderia ter sido a escrever isto.

Gostei. beijinhos

Uma Coral chamada Petra disse...

inv3rs0 :

Introspectivo? Hum...interessante! Obrigada. beijinhos e Parabens pelo teu blogue. É simplesmente fantastico.

beijinhos

Uma Coral chamada Petra disse...

Naja: As tuas palavras tao afectuosas, tao cheias de "tanto". Decifras tao bem cada palavra desta coral.

Obrigada .

beijinhos

Uma Coral chamada Petra disse...

Inês e Mafalda :

Há coisas que todos nós sentimos pelo menos uma vez na vida.

;)

M disse...

não sei bem como vim aqui parar...

Ler este texto fez-me Bem. é facto que já antes me deparei com palavras que me deixaram atónita, mas, de facto, nesta descrição, encontro Muito do que já senti (e sinto).
independentemente de ter vivido situação semelhante ou não; foco-me no Poder que alguém que amámos/amamos (ainda) exerce sobre nós. é "engraçado".
é certo que vivemos e deixamos que nos marquem, mas há sempre Aquele que, mesmo já não estando connosco, permanece em nós por tempo indeterminado... mesmo quando já nem nos damos conta disso.

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